Navegando nas águas do Pantanal

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Isolina Xavier Bandeira e Joaquim Lopes Bandeira

Pescador
Sr. Joaquim, esposo de D, Isolina. Imagem de arquivo pessoal.

Ano 1974.

“Esta é a minha história de pescadora:

Bem antes de ser pescadora eu e meu esposo vivíamos de lá para cá, trabalhando aqui e acolá, mas nosso sonho era sermos pescadores.

Foi então que resolvemos vender nossa casa com todos os moveis e nos mudarmos para a cidade de Miranda.

Com o dinheiro adquirido com as vendas, compramos uma lancha e duas canoas.

Em 1975, eu, meu esposo Joaquim e meus filhos pegamos todos o que precisávamos, (ferramentas para acampar, tralha de pesca e mantimentos) e partimos para o rio.

Viajamos o dia todo rio acima, chegamos em uma praia com o nome de praia redonda que se localizava em frente a Aldeia La Lima.

Ali montamos acampamento utilizando madeira e palha bacuri. Ficamos acampados durante 30 dias, pegamos 600 Kg de peixes.

Naquela época as coisas eram muito difíceis, não havia peixeiros para comprar os peixes e não tínhamos caixa térmica ou freezer para armazenar o pescado.

Então resolvemos mudar de ares. Fomos para Rondonópolis, no começo foi muito difícil, mas conseguimos construir outra lancha e outras canoas e novamente fomos pescar no Rio Vermelho. Ficamos ali um ano apenas. O rio era muito assoreado e muito ruim de pescar.

Foi então que resolvemos fazer uma aventura rio abaixo com tudo que sonhamos que não era muito. Levamos apenas o necessário: mantimentos, vasilhas, remédios, colchões, mosqueteiros, roupas e muitos sacos de sal para salgarmos os peixes que pegarmos, pois não tínhamos gelo para conservar o peixe.

Na barra do Rio Vermelho com o São Lourenço até na cachoeira do perigara.

Pegamos muitos peixes em um lugar maravilhoso com praias lindas, muitas gaivotas. Nossa aventura durou 41 dias acabou com o nosso arroz e por isso comíamos muitos ovos de pássaros que encontrávamos nas praias.

Nossa sorte era que tínhamos rádio que trocamos a troco de arroz com casca, com os ribeirinhos. Então procuramos madeira grossa para fazermos nela um pilão para beneficiar o arroz com uma mão de pilão feito de galhos de arvores, foi uma aventura inesquecível atravessamos todo o Pantanal. Passamos por muitos afluentes, até sairmos na barra do São Lourenço no Rio Paraguai. Acampamos ali na barra por 12 dias para decidir o rumo que iríamos tomar por que o caminho era desconhecido.

Vendemos nosso peixe seco para um senhor que viajava em um navio cargueiro para baixo e para cima comprando e vendendo todo o tipo de produto.

Após 12 dias conversando com um aqui e outro ali meu esposo Joaquim negociou uma posse em uma ilha só que o destino não quis. Não conseguimos passar pela baia chamada gaiva que era muito extensa e de ondas muito altas. Quase naufragamos batemos em uma pedra muito grande e já era noite então paramos no barranco e tinha um senhor pescando e nos convidou para jantar e pernoitar em sua casa na verdade era um barraco de palha de bacuri, um rancho de empreiteiros da fazenda que ficava na divisa com a Bolívia. Bem, ali fizemos amizades, e o Joaquim e um de meus irmãos foi ajudar o senhor que havia nos hospedado a fazer cercas.

Três meses se passaram, terminou o serviço e resolvemos descer o rio rodando com a lancha.

Chegamos a uma ilha chamada Canafisto, onde permanecemos algum tempo, vivendo apenas da pesca. Conhecemos pessoas muito boas na região, mas não poderíamos ficar ali por mais tempo, pois não tinha trabalho além da pesca e não podíamos nos sustentar.

Resolvemos descer mais o rio, sem destino, depois de oito dias rodando, passamos por vários perrengues, enfrentamos tempestades, dificuldades em preparar os alimentos, pois em todos os lugares que parávamos para acampar, era necessário fazer um fogão a lenha para cozinhar.

Lembro-me de uma noite que tivemos que dormir eu, meu esposo e nossos quatro filhos me um só mosqueteiro, porque as margens do rio estavam alagadas e não foi possível montar acampamento, então passamos a noite na lancha.

No outro dia rodamos até a barra do Rio Paraguai Mirim: Um pouco adiante, famílias moravam na beira do rio, pessoas muito hospitaleiras, convidaram-nos para o almoço: Peixe ensopado com mandioca, comida de pantaneiro, muito boa por sinal.

Após o almoço, rodamos mais um pouco e chegamos a uma fazenda por nome Laranjeira. Havia um rancho na beira do rio, fomos conversar com o fazendeiro e ele nos disse que estava precisando de mão de obra para retirar o gado. Era com o trabalho, pois tinha leite e a pesca era farta. Mas durou pouco, o serviço terminou e voltamos para junto os vizinhos que conhecemos rio acima as quais haviam nos convidado para morar ali.

Construímos um barraco com lona e madeira, de tamanho 4m por 4m. Ali nasceu nosso sexto filho, ao qual chamamos de Gilmar, o ano era de 1977 e fazia cinco meses que estávamos naquele lugar. Meu esposo Joaquim é quem foi meu parteiro.

Após dezoito dias do nascimento do nosso filho, nos mudamos para uma ilha chamada Laranjeiras, onde a terra era muito fértil, tudo que plantávamos nascia em fartura: Banana, abobora, mandioca, batata e verduras. Os peixes que pescávamos, salgávamos para poder trocar por mantimentos com as lanchas que por ali passavam.

Vivemos ali por dois anos, os quais foram muito bons, pois tínhamos fartura de tudo, já que no segundo ano plantávamos também arroz, milho, amendoim e feijão, e tudo estava produzindo. Éramos felizes ali, mas de repente tudo mudou. Nosso filho Osmar ficou doente, e era grave e para piorar a situação, a ilha que não era atingida por enchentes já a 35 anos, ficou toda alagada, destruindo toda a plantação, perdemos tudo!

Então fretamos uma lancha e tiramos o que deu para tirar: 13 sacos de arroz, 2 de farinha de mandioca, utensílios domésticos, roupas e alguns pertences e fomos para um abrigo da prefeitura em Corumbá.

Uma semana depois, o proprietário de uma casa na ilha, voltou até lá para buscar o restante de seus pertences. Pedimos para dividir o frete da lancha para poder trazer o que tínhamos deixado para trás, nossos animais, mantimentos, colchões, roupas etc.

Ficamos em Corumbá por um ano, onde levei meu filho ao médico e após vários exames, começou o tratamento, mas neste período de um ano, ele não demonstrava nenhuma melhora, então pedi um encaminhamento e o levei para São Paulo, onde ficou por um ano e oito meses em tratamento, e graças a Deus, e aos médicos, meu filho ficou curado.

Após a alta médica, voltamos para Miranda com nossos cinco filhos:

Nilza, Edgar, Hilda, Osmar e Gilmar.

Nossa filha mais velha Geny que já estava casada, morava em Miranda já a algum tempo, e viemos morar perto da sua casa.

Em 1980 nasceu nossa filha caçula, Gilmara que assim como o irmão Gilmar, também veio ao mundo através das mãos do meu esposo.

Em 1982, após outra temporada em São Paulo e mais um retorno a Miranda, compramos outra lancha e canoas para pescar e estamos pescando até hoje.

Nos tornamos pescadores profissionais e crianças, filhos e netos os quais muitos são pescadores também.

De lá para cá a vida melhorou muito, temos lanchas confortáveis, trocamos as movidas a motor de popa e continuamos sobrevivendo da pesca”.

D. Isolina e Sr. Joaquim em Miranda - MS. Janeiro/2017 .Foto: Nathália Eberhardt
D. Isolina e Sr. Joaquim em Miranda – MS. Janeiro/2017 Foto: Nathália Eberhardt

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